A Sociedade da Terra Plana
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A Sociedade da Terra Plana


Tenho o péssimo hábito de não terminar os livros que começo. Quem olha para minha estante vê uma infinidade de marcadores se sobressaindo por detrás da lombadas dos livros. Aliás é muito provável que eu tenha mais marcadores que livros... É que como não tenho o tempo que tinha antigamente para ler um livro até o fim de um só fôlego, sou obrigado a ler aos poucos e isso acaba fazendo com que meu interesse se volte para outra coisa, ou outro livro. Pois enquanto olhava para as prateleiras e refletia sobre esta minha condição de mal leitor, avistei um dos livros inacabados que mais me pesa na consciência: Flatland. O País Plano de Edwin A. Abbott

"Flatland" é sobre o mundo que não vemos e por isso evoca questões transcedentais como quarta dimensão, universos paralelos, dimensões invisíveis, a Matrix, e por aí vai, progressivamente adentrando no controverso terreno espiritual.

Flatland é um mundo bidimensional, ou seja, as coisas não têm altura, só largura e comprimento. É como o mundo seria se vivessemos numa folha de papel. Pra tornar as coisas mais legais, os habitantes deste mundo são polígonos: triângulos, quadrados, hexagonos, círculos, etc, e a conservadora hierarquia social é dada pelo número de lados de cada pessoa - quanto mais lados, mais nobre é o cidadão desta legítima Terra Plana. Assim os triângulos constituem a classe mais baixa de Flatland (exceto os equiláteros, cuja perfeição é muito apreciada); os quadrados vêm logo em seguida e assim por diante até o nobílissimo Círculo, cujo número infinito de lados lhe garante a condição de Rei. Como não dispõem da vista superior, os habitantes de Flatland enxergam um ao outro na forma de segmentos de reta (que é como se pareceria um polígono se você pudesse vê-lo de frente). Então a única maneira que um morador de Flatland tem para saber o número de lados de outro é tateando o companheiro ou então avaliando a diferença de constraste provocada por uma névoa sempre presente em Flatland, que também permite distinguir profundidades.



"Flatland" foi escrito no final do século XIX e o autor embutiu em seu livro uma sátira à condição submissa das mulheres da época: em Flatland as mulheres são linhas, não tem nem sequer largura, e por isso estão abaixo até mesmo dos vulgares triângulos na escala social. Como são pontudas, as mulheres são consideradas extremamente perigosas porque podem desastradamente perfurar algum desavisado transeunte. Além disso elas podem ficar invisíveis, bastando ficar de frente para o observador. Genial. Pena que tenha gente que não entenda a piada e interprete isso como sinal de misoginia do autor.

Bem, o livro é delicioso enquanto explica o funcionamento e os protocolos de Flatland. Mas a história fica melhor ainda quando o personagem principal, Quadrado - geômetra do reino - começa a narrar suas viagens a outros mundos: a pontolândia - onde os habitantes não tem dimensão - a linhalândia - onde todos são segmentos de reta - e a espaçolândia - mundo como o nosso onde Quadrado é guiado por uma esfera que lhe explica que há outros mundos ainda, com 4, 5 ou mais dimensões. Quando volta ao seu país e tenta convencer os outros habitantes de que existem outros mundos além das duas dimensões, Quadrado é massacrado pelo dogmatismo da classe dominante e preso pelo resto dos seus dias, por espalhar idéias heréticas. É evidente que essa moral é amplamente utilizada pelos Cultuadores de Dragões Invísiveis, que abusam do direito de se colocar nos papéis de Galileo e Colombo.

Incrível é que esse clássico da literatura só tenha ganhado uma edição brasileira há dois anos atrás (a versão inacabada da minha estante é de portugal) e com pouquíssima repercussão, mas pelo menos bem fiel ao original: Planolândia, um romance de muitas dimensões. Uma pena... se a gente vivesse no mundo em que eu queria viver, esse livro seria usado nas escolas para ensinar geometria às crianças.

Pra quem sabe inglês, o livro pode ser lido de graça em inúmeros sites, entre eles este aqui.




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