Um saudoso acompanhantePor Gustavo do Carmo / Fotos: Divulgação
Há vinte e cinco anos o Ford Escort (acompanhante em inglês) era lançado no Brasil. Logo se tornou um sonho de consumo dos jovens motoristas dos anos 80. Fez a alegria dos adolescentes endinheirados e recém-habilitados.
O novo compacto (de 3,97 metros de comprimento) trouxe a modernidade para a linha Ford. Entre 1982 e 1985 o mercado brasileiro vivia uma febre de carros mundiais. Chevrolet Monza, Fiat Uno, Volkswagen Santana e Quantum eram as novidades do período. Três anos depois de ser lançado na Europa, como a terceira geração de uma linha criada em 1968, o Escort inovava no Brasil com um formato inédito de carroceria: um hatch de dois volumes e meio. A tampa traseira era bem inclinada como o dos seus contemporâneos Gol, Passat, Chevette Hatch, Monza Hatch e Fiat 147. Mas tinha uma pequena continuação, que formava a discreta saliência, que abria junto com o vidro. As janelas laterais, principalmente as posteriores, eram amplas e davam boa visibilidade. Inclusive na versão quatro portas, que formava um grande vidro vigia. A dianteira era em cunha, com faróis retangulares levemente trapezoidais e grade de plástico. O coeficiente aerodinâmico era o menor do Brasil: 0,386. E a garantia de três anos contra corrosão era a maior do mercado.
O acabamento interno era ótimo. Bem acarpetado nos bancos e assoalho e totalmente revestido nas portas. Era uma evolução até mesmo dentro da Ford. E olha que o luxuoso Del Rey já tinha bom acabamento. O espaço e o nível de ruído também agradavam.
O motor era transversal e tinha duas opções de cilindrada: 1.3, com 63,5 cavalos de potência quando movido a álcool e 57 cv a gasolina, e 1.6 com potências respectivas de 73 e 65 cavalos. Como a tecnologia flex só surgiria vinte anos depois, o comprador daqueles tempos tinha que optar entre um ou outro combustível antes de assinar o cheque pelo carro. Era um motor fraco, mas em compensação, bastante econômico. Outros dois pontos fortes do carro eram a boa estabilidade e a suspensão macia. A folga da embreagem tinha ajuste automático.
Apesar da modernidade do Escort, o motor foi adaptado do Corcel. Mudaram o pistão, o comando de válvulas, bloco e a câmara de combustão. Rebatizaram de CHT (Compound High Turbulence) e o instalaram até no Volkswagen Gol seis anos depois. O motivo da adoção de um motor guaribado foi o mesmo que as montadoras argumentam até hoje para nos privar de veículos modernos: economia de custos para tornar a produção viável. O projeto do Escort custou 400 milhões de dólares. Um novo motor ia encarecer ainda mais.
O Escort chegou ao mercado brasileiro em três versões de acabamento: básica, L e GL. Alguns meses depois do lançamento, começou a ser vendido o luxuoso Ghia, que tinha calotas integrais e frisos cromados sobre os faróis e a grade. Por dentro, mais veludo e o relógio azul no teto, próximo ao retrovisor interno, dando o toque futurista ao "novo" carro, embora já fosse usado no Del Rey. Entre os equipamentos foram oferecidos vidros e travas elétricos, vidros em bronze (trocados por verdes no ano seguinte), limpador de pára-brisa com intervalo ajustável e luzes de aviso para desgaste das pastilhas de freio, nível de combustível, óleo do motor, líquido de arrefecimento, entre outros. O Ghia e as outras três versões podiam ter duas ou quatro portas, fazendo do Escort o primeiro carro brasileiro com esta opção simultânea.
Ainda em 1983 foi a vez de aparecer a versão esportiva que transformou o compacto no queridinho da juventude rebelde dos anos oitenta e foi o ícone da linha Escort: o XR3 (sigla de Experimental Research 3). Tinha faróis de milha redondos instalados na frente da grade, faróis de neblina no pára-choque, lavador dos faróis normais, rodas de 14 polegadas com o famoso estilo "trevo de quatro folhas", aerofólio traseiro e teto solar. O ar condicionado foi oferecido como opcional. O motor era o mesmo 1.6, mas ganhou alguns "venenos" nas mesmas peças que originaram o CHT para aumentar a potência em dez cavalos.
Outra versão, lançada em 1985, que fez a fama do Escort foi o XR3 Conversível, nome com o qual os brasileiros passaram a chamar os carros de capota removível. Uma definição mais nacionalista do que Cabriolet e mais charmosa do que os "descapotáveis" chamados pelos portugueses. O Conversível tinha uma coluna estrutural em forma de arco bem chamativa (e mais segura), uma traseira maior e lanternas verticais. Isso aumentou o peso do carro em 64 kg, comparado ao hatch fechado.
O conversível não foi um pioneiro mas quebrou um jejum: um carro desse tipo voltava a ser produzido em série no Brasil depois de quinze anos. O último havia sido o Karmann-Ghia, que teve a produção encerrada em 1970. Curiosamente, a própria Karmann, que tinha fábrica em São Bernardo do Campo, SP, vizinha da Ford, era quem transformava o carro. Mesmo com a proximidade das unidades, os carros iam e voltavam, necessitando de transporte e gerando despesas. Por isso e também pela presença de materiais importados na traseira, nos reforços da carroceria e até o suporte da placa moldado no tamanho europeu, o Conversível custava bem mais caro que a carroceria fechada, que já era cara até na versão básica. Porém, as rodas de liga-leve eram opcionais e de série vinha uma calota branca com vários furos circulares que lembram um jogo de resta 1. Também não tinha faróis de neblina e nem o limpador dos faróis principais. Apesar de tudo isso fez mais sucesso que o modelo de quatro portas, que saiu de linha em dois anos enquanto o aberto durou dez anos ininterruptos.
Foi eleito o Carro do Ano em 1984 pela revista Autoesporte.
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